O Fim da Realidade Intocada

Em um anúncio que parece ter sido retirado de uma tela de ficção científica, o Figma revelou, em seu blog oficial datado de 10 de dezembro de 2025, um trio de novas ferramentas de edição de imagem baseadas em inteligência artificial. Destinadas a designers em seus planos pagos, as funcionalidades Apagar objeto (Erase object), Isolar objeto (Isolate object) e Expandir imagem (Expand image) prometem fechar o ciclo do fluxo criativo. A proposta é permitir que a manipulação precisa de imagens ocorra inteiramente dentro da familiar tela da plataforma, pondo em xeque não apenas a necessidade de migrar para outros softwares, mas talvez nossa própria percepção do que é uma imagem 'real'.

A fotografia, antes um registro quase sagrado do instante, agora se torna um material fluido, uma tela aberta à reinterpretação. O que significa criar quando podemos apagar o que não nos agrada com a mesma facilidade com que deletamos uma palavra? O Figma não está apenas otimizando um processo; está nos entregando o poder de reescrever a memória visual, um poder que carrega tanto a promessa da perfeição estética quanto o peso da inautenticidade.

Os Três Pincéis da Inteligência Artificial

A novidade, segundo Marvin Qian, engenheiro de software da empresa, foi motivada pela alta adesão dos designers à ferramenta já existente de 'Remover fundo', um indicativo claro da necessidade de centralizar o trabalho de edição. A nova tríade de ferramentas, agora agrupada em uma barra de ferramentas mais acessível, ataca diretamente os pontos de atrito mais comuns no dia a dia criativo.

  • Apagar objeto: Quantas vezes olhamos para uma foto e desejamos que um elemento indesejado simplesmente deixasse de existir? A ferramenta 'Apagar objeto' transforma esse desejo em um comando. Basta selecionar a área e a IA se encarrega de remover o elemento, reconstruindo o fundo de forma coerente. É a curadoria da memória visual, um 'Ctrl+Z' aplicado não ao erro, mas à própria realidade capturada.
  • Isolar objeto: E se, em vez de apagar, quiséssemos apenas dar um novo palco a um protagonista? O 'Isolar objeto' permite exatamente isso. A função possibilita selecionar um único objeto ou pessoa para editá-lo de forma independente, aplicando efeitos como desfoque, correção de cor ou sombras, sem alterar o restante da imagem. É uma dança de luz e sombra que antes pertencia a estúdios complexos, agora acessível com alguns cliques. O que isso significa para a autenticidade de um registro quando podemos mudar o foco da narrativa visual a nosso bel-prazer?
  • Expandir imagem: A tela nem sempre se conforma à nossa visão. O 'Expandir imagem' quebra essa limitação, estendendo o fundo de uma imagem para se adaptar a novos formatos sem distorcer o conteúdo principal. Uma foto quadrada (1x1) pode se transformar em um banner para a web, com a IA gerando as laterais que nunca foram fotografadas. A máquina não apenas edita o que existe, mas cria o que nunca existiu para preencher o vazio. Onde, então, termina a fotografia e começa a ficção generativa?

Créditos, Contas e o Futuro da Criação

Essa nova dimensão de poder criativo não é, contudo, universalmente acessível. As novas capacidades de IA estarão disponíveis no Figma Design e no Figma Draw para todos os usuários com um assento 'Full' nos planos Profissional, Organização e Enterprise que tiverem a IA habilitada. A democratização da edição avançada tem seu preço, e no ecossistema Figma, ele é medido em créditos de IA, que são consumidos a cada ação executada.

A empresa deixa claro que este é apenas o começo. Conforme o comunicado, há planos para levar essas ferramentas a mais produtos da plataforma Figma no próximo ano. Estamos, portanto, diante de um novo paradigma onde a barreira entre o design de interface e a manipulação de imagens se dissolve completamente.

O Designer como Ilusionista Digital

O que o Figma propõe não é apenas uma otimização de fluxo de trabalho; é uma profunda provocação filosófica. Ao integrar ferramentas que alteram a composição fundamental de uma imagem com tanta fluidez, a plataforma nos convida a questionar a natureza da verdade e da criação visual na era da inteligência artificial. Estamos testemunhando a evolução natural do design ou o nascimento de uma nova e sofisticada forma de ilusionismo digital? A resposta, como sempre, talvez esteja escondida nos pixels que agora podemos editar, apagar e expandir com uma liberdade que beira o divino.